Assembleia Municipal de Montemor-o-Novo assinala o 40º Aniversário do Assassinato de Caravela e Casquinha
Atualizado em 28/08/2020Na sessão da Assembleia Municipal de Montemor-o-Novo, realizada no dia 20 de setembro de 2019, foi apresentada pelos Eleitos da CDU-Coligação Democrática Unitária a seguinte Evocação:
«No dia 27 de setembro fará 40 anos que, na herdade de Vale de Nobre, freguesia de S. Cristóvão, foram covardemente assassinados os trabalhadores José Geraldo “Caravela”, de 57 anos e António Maria do Pomar Casquinha, apenas com 17.
Estes trabalhadores apenas estavam a defender pacificamente aquilo que consideravam justo e, portanto, a exercer o seu direito de resistência, direito esse consagrado na Constituição da República.
Estavam, juntamente com outros trabalhadores, alguns dos quais ficaram também feridos, a defender aquela que foi uma das mais belas conquistas da revolução de Abril, a Reforma Agrária.
Essa Reforma Agrária que permitiu a saída do limiar da pobreza a milhares de trabalhadores do Alentejo ao garantir trabalho remunerado todo o ano e alguns dos direitos que, ainda hoje perduram tal como as ferias ou os feriados pagos, o subsídio de férias ou o 13o mês.
A mesma que permitiu que nesses anos Portugal se tivesse tornado quase autossuficiente em matéria alimentar.
Aquela Reforma Agrária que os governos da altura atacaram e destruíram levando de novo o desemprego e o espectro da fome aos campos do Alentejo.
Estes trabalhadores morreram assassinados em tempo de “Democracia” e os seus assassinos diretos ou os mandantes nunca foram julgados.
Quando se julgava que os assassínios políticos já pertenciam a um tempo que tinha acabado, eis que a dura realidade nos aparece, nua e crua.
Nestas situações ficamos com um nó na garganta e as palavras recusam- se a formar-se.
Quando não temos palavras socorremo-nos das palavras de outrem.
Neste caso pedirei emprestadas as palavras do poeta José Gomes Ferreira:
“Aqui
nesta planície de sol suado
dois homens desafiaram a morte, cara a cara,
em defesa do seu gado
de cornos e tetas.
Aqui
onde agora vejo crescer uma seara
de espigas pretas.
Quando os dois camponeses desceram às covas,
ante os punhos cerrados de todos nós,
chorei!
Sim, chorei
sentindo nos olhos a voz
do que há de mais profundo
nas raízes dos homens e das flores
a correrem-me em lágrimas na face.
Chorei pelos mortos e pelos matadores
– almas de frio fundo.
Digam-me lá:
para que serviria ser poeta
se não chorasse
publicamente
diante do mundo?”
Montemor-o-Novo, 20 de Setembro de 2019